Passaram 2 meses e algo desde que chegámos a
Moçambique.
A nossa vida não mudou demasiado comparando com os
ultimos meses em Espanha.Acordamos e não temos nada para fazer. O David tem
mais actividade intelectual que eu.
Para alguns esta seria uma vida de sonho. Para mim
é desprezível. Não gosto de viver assim. Perco dias e dias de vida útil. Acho
aborrecido acordar de manhã e pensar “ E hoje vou-me aborrecer com o quê?”.
Tento procurar fontes de entretenimento: faço
desporto (estou um bocadinho mais magra), vou à dança (Lingy Hop), passeio
muito pela cidade, de vez em quando tomo um café com amigos e conhecidos, faço
planos maqueavélicos para poder aceder 5 minutos à internet, estudo on-line e
leio. Gostaria de poder pensar mas o tico
e o teco tornaram-se demasiado preguiçoso. Esta seria a oportunidade ideal
para escrever um livro mas a minha imaginou pifou no dia em que deixei de
estudar para o código (Junho de 2012).
Tento, em vão, procurar uma porta- ou uma
janelinha- de entrada no mercado de trabalho moçambicano mas é dificil contudo,
embora em alguns momentos a melancolia me visite, estranhamente sinto uma
espécie de alegria silenciosa. Às vezes é uma alegria latente, por exemplo como
quando acabo de fazer exercício físico, mas, normalmente, é uma “picadinha”
omnipresente. Uma espécie de bom feeling e vontade de sorrir aos que passam por
mim na rua.
Há dias fomos a Muhalaze, o sítio onde supostamente
vamos viver e trabalhar, e essa tal alegria fez-se presente. À parte o aborrecimento
dos meus dias e o esforço sobre-humano que faço para não me deixar abater uma
das coisas que mais me cansa é viver em Maputo, num bairro de brancos com
dinheiro. Vivo numa borbulha. Eu sei que Moçambique não é assim mas não consigo
alcançar o verdadeiro país, a verdadeira cultura moçambicana enquanto estiver
aqui. Quando entro em lojas ou visito feiras de artesanato não compro nada. Os
feirantes não sabem mas eu tenho tanta liberdade financeira quanto eles. Salvo
raras excepções, a maioria olha para mim como um potencial comprador por isso
fazem má cara quando lhes digo que não posso, que não quero comprar, que não
tenho dinheiro.
Foi numa dessas vezes que conheci o Luis. Eu queria
entrar na Catedral de Maputo e ele mostrou-me onde era a porta. O Luis é
vendedor de lâminas (quadros de tecido pintados à mão) e disse-me que ia
esperar por mim para falarmos. Eu dei-lhe logo a entender que não lhe ia
comprar nada. Fiquei mais de 30 minutos a desfrutar do silencioso dentro da igreja
e, finalmente, quando saí, o Luis continuava à minha espera. Eu contei-lhe a
minha vida em Moçambique e ele contou-me a dele. É estudante de Engenharia e
pinta lâminas para pagar as propinas. Em nenhum momento me mostrou qualquer uma
delas e, na despedida, desejou-me,genuínamente,
sorte. Foi, quizás, uma das poucas vezes que pude falar com um local sem
o estigma cor-de-pele a interferir.
Voltando ao passeio em Muhalaze gostei, sobretudo,
do contacto com as pessoas. Praticamente não falei com ninguém mas gostei de
ajudar os vizinhos que pediam boleia a subirem para a parte de trás da pick-up.
E os meninos da escola que faziam uma gritaria quando nos viam passar. As casas
também são mais bonitas. Feitas de palhotas ou mal acabadas em blocos de
cimento estão, normalmente, construídas debaixo de frondosas árvores. E nos
pátios (alpendres) as crianças brincam e/ou tomam banho enquanto os país
convivem com os vizinhos numa amena cavaqueira.
Por tudo isto, acredito que as coisas vão melhorar, que a viagem a
Moçambique e a mudança radical de vida vão valer a pena quando o meu dia-a-dia
se misturar com o dia-a-dia de essas pessoas simples e alegres e que,
aparentemente, vivem a vida como se esta fosse uma capulana: alegria, cor e
movimento.
[“Come Sónia, come chocolates que os
chocolates não têm metafísica”]
Detalhes de Muhalaze:
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