quinta-feira, 25 de abril de 2013

Porra!



Cada vez mais chego à conclusão que odeio pessoas. Deve ser muito bom ser galinha e estar todo o dia pescoço para cima, pescoço para baixo a picar na terra, sem preocupações, nem questões de ordem filosófica a atormentarem a boa disposição. 


quarta-feira, 17 de abril de 2013

Hoje eu não me recomendo




Não queiras saber de mim
Esta noite não estou cá
Quando a tristeza bate
Pior do que eu não há
Fico fora de combate
Como se chegasse ao fim
Fico abaixo do tapete
Afundado no serrim


Não queiras saber de mim
Porque eu estou que não me entendo
Dança tu que eu fico assim
Hoje não me recomendo


Mas tu pões esse vestido
E voas até ao topo
E fumas do meu cigarro
E bebes do meu copo
Mas nem isso faz sentido
Só agrava o meu estado
Quanto mais brilha a tua luz
Mais eu fico apagado


Dança tu que eu fico assim
Porque eu estou que não me entendo
Não queiras saber de mim
Hoje não me recomendo


Amanhã eu sei já passa
Mas agora estou assim
Hoje perdi toda a graça
Não queiras saber de mim

terça-feira, 16 de abril de 2013

Breve reflexão sobre a Cooperação e a Sacanagem


"Que pequeña es la luz de los faros de quién sueña con la libertad" J. Sabina


Tal como deixei patente neste texto, a cooperação está para ajudar a impulsionar o crescimento e desenvolvimento  dos países mais pobres. No meu ponto de vista, o papel das agências de cooperação, assim como dos cooperantes é de actores secundários. Em nenhum momento deverá ser desconsiderada a opinião, participação e posição das populações intervidas. Só assim os projectos criados podem ser factíveis e sustentáveis, i.e, só assim o trabalho desenvolvido poderá ter uma larga vida.


O logotipo da fundação África Directo está muito bem conseguido e espelha bem essa urgência do homem branco saber trabalhar como background do homem negro, ou amarelo, ou castanho ou, porque não, branco outra vez. Porque achamos sempre que o homem branco não precisa de ajuda ao Desenvolvimento? Até há pouco tempo Portugal era um dos principais beneficiários da ajuda comunitária que é, em grande medida, ajuda ao Desenvolvimento, apenas lhe deram outro nome e apelido.

Voltando ao meu ponto de partida, o papel da cooperação, sobretudo a cooperação no terreno. Até há muito pouco tempo tinha uma visão idílica. Imaginava o cooperante um tipo valente, uma espécie de Zorro moderno, que deixava o seu país, as suas origens, a família, amigos e domingos perdidos no sofá a ver os programas dos Julios Isidro para ajudar os mais desprotegidos. Não digo que não o sejam, eu própria de vez em quando visto a pele de “Zorro”, mas já não acho que as coisas sejam tão lineares.

Primeiro, descobri (ou decidi assumir) que há almas que andam pelo mundo a um compasso diferente do corpo. São, por assim dizer, gente que tem  inquietações tão grandes que não conseguem estar quietos. A vida, o dia-a-dia no mesmo sítio, com as mesmas rotinas terminam assumindo um papel depressivo. Por isso, essa gente vai pelo mundo curando os demónios dos demais na expectativa latente de curar os seus próprios demónios. Não siginifica que o façam conscientemente mas...fazem-no. Taõ pouco significa que não sejam pessoas mais que válidas para ajudar a “resolver” algumas das lacunas dos países mais pobres. Simplesmente, quero dizer que deixei de olhar para os cooperantes como beatos dos tempos modernos.

Por outro lado, é mais que sabido que, assim como há sacanas em todas as raças e credos, também há boas pessoas, portanto dizer que X ou Y países ou regiões no planeta são mais propícias a um tipo de comportamento seria, como pouco, generalizar e roçar a injustiça.

O que sim posso afirmar sem me sentir culpada ou generalista é que há sítios onde, por ausência de autoridade jurídica e moral ( e não me refiro à moral religiosa, refiro-me à moral aprendida nos bancos da escola) se assemelham a uma  anarquia e que são propicias à corrupção “ da alma”.

Fazendo um paralelismo com o mundo da cooperação, o que eu quero dizer é que, há pessoas que quando chegam a países onde existe total ausência de autoridade e, não têm muito claros os propósitos da sua presença, perdem a noção do certo e do errado, mesmo que anteriormente tenham sido boas pessoas e que os seus propósitos iniciais fossem genuínos.

Não é ,pois, de estranhar que algumas ONG´s no terreno se dediquem à boa vida e a gastar dinheiro público e privado em, literalmente, putas e vinho verde. Alguma dessas ONG´s, de vez em quando patrocinam alguma infraestructura e fazem corpo de presença em alguns actos, para a foto.  Outras há que nem sequer patrocinam, nem fazem corpo de presença porque o dinheiro já foi todo gasto em alojamento em bairros de ricos, em vinhos tintos de alta qualidade, em contas de telefone que farião corar de vergonha a Paris Hilton. Mesmo assim continuam a apregoar a boa fé do seu trabalho e a pseudo-sapiência sobre costumes e hábitos locais.

Hoje em dia, eu não sou cooperante, nem pseudo-cooperante, nem coisa nenhuma. Sou só uma pessoa com altos níveis de frustração, depois de meses e meses a tentar recalcar a minha criatividade.  Na minha vida existe uma ONG que trabalha nessas condições que acabo de descrever e o que mais me lixa é que Moçambique é um pais propício à pouca vergonha e anarquia. Sinto-me impotente porque sei que há dinheiro mal canalizado, que poderia ajudar a impulsionar o cresicmento e desenvolvimento de bairros e pessoas através de construção de escolas, hospitais, bolsas de estudo por  mérito ( e não por beleza wonderbra). Chateia-me saber que não há ninguém a quem possa denunciar a má gestão de uma ONG que é gerida com fundos privados de ricalhaços ex-dirigentes de bancos e gestores de bens alheios. E sinto-me profundamente enganada e desenganada porque, por mais que procure outras oportunidades, chego à conclusão que o mundo está cheio de padrinhos, de compadres e de filhos da puta...





* Que conste que a ONG à qual me refiro não é a Fundação África Directo. Com a FAD só tive boas experiências e fartei-me de conhecer gente de alto gabarito humano.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Xtike


Há cerca de 1 mês tive uma dessas experiências que qualquer que viaje a um país estrangeiro almeja, ou seja, viver na 1º pessoa um pouco da cultura local.

A Tatiana, brasileira em Madrid, estava de passo pela cidade e o Edgar, moçambicano, amigo em comúm, convidou-nos aos 3 para irmos a uma festa familiar.

Para os moçambicanos- ou para os africanos, em geral- a família é o mais importante. Existem outros valores que são de igual importância, inclusivé valores materias e/ou superficiais mas, no fundo, a família será sempre o ponto de partida e de chegada. E quando me refiro a família falo de família alargada, que difere bastante do nosso conceito de família alargada. Enquanto nós, na Europa (ou mundo ocidental) falamos de pais, filhos, netos e, por vezes, alguns tios e primos e, nesse caso já estamos a ir muito além da familia nuclear, para eles família são todos os tios, todos os primos, todos os idosos (a mãe do tio político e que, aparentemente, não pinta nada), todas as crianças e por aí fora.
Assim, considerando a importância da família, os moçambicanos encontraram o  alíbi perfeito para se reunirem com os seus uma vez por mês ou várias vezes ao ano e ajudarem-se uns aos outros: chama-se xtike.

Condicionados pela correria do dia-a-dia, são privados da companhia das suas famílias. Segundo me contaram, as famílias que não fazem xtike ficam meses sem se verem. Só se encontram por casualidade ou nalgum momento de doença ou morte de algum membro da família

Como funciona?

Para participar no xtike é necessário entregar uma certa quantia em dinheiro que é colocado todo junto e entregue mensalmente a uma família nuclear dentro da familia alargada.

Por exemplo, a família Lameira entrega o dinheiro do xtique do mês de Fevereiro ao casal X e Y Lameira. Assim, o casal X e Y durante o mês de Fevereiro usufruem de um empréstimo familiar para organizar a sua vida sem ser necessário recorrer a bancos ou outras entidades creditícias que cobram juros altíssimos.

É uma espécie de mealheiro familiar. Ninguém perde ou ganha dinheiro. Em vez de colocarem mensalmente uma quantia numa conta poupança, entregam o dinheiro a um “tesoureiro” voluntário da família. Esse dinheiro nunca fica parado porque todos os meses é disponibilizado a outros membros da família que, por sua vez, disponibilizaram também eles a mesma quantia, num ciclo perfeito.

À parte é entregue também uma quantia mais pequena a uma família nuclear que se converte, assim, em família cicerone. É responsável não só de receber a família alargada para procederem à entrega do xtique do mês, como também de preparar comida em quantidade suficiente para alimentar um batalhão de gente que chega com o apetite inerente à alegria de se encontrar com os seus.

A logística é organizada de acordo com a cultura local e, moçambicano que se preze, dança até cair para o lado mesmo que tenha 200kg e uma barrigada de cerveja e delícias culinárias. As cadeiras são postas em circulo e, no meio, fica um espaço aberto onde mais tarde todos abanam o esqueleto. No fim da festa, para apaziguar os danos provocados pelo alcóol aka ressaca e/ou mau vinho, servem-se iguarias que podem ser cabeça de vaca, dobrada etc...
Pelo meio são entregues presentes aos aniversariantes do meses anteriores ou aos donos da casa. São, também, entregues capulanas com o mesmo padrão a todas as mulheres que assim o desejem (mediante o pagamento prévio à pessoa responsável de comprar as capulanas). Assim, todas as mulheres se passeiam para lá e para cá embrulhadas na mesma capulana.

Hospitabilidade é sinónimo de povo moçambicano

O que mais me surpreendeu foi a hospitalidade com que fomos recebidos. Desde o primeiro momento fizeram-nos sentir em casa sem que tivéssemos a sensação de sermos uns intrusos. Falaram conosco, contaram-nos coisas das suas vidas e cultura, pontos de vista, por vezes tão diferentes, mas que só demonstram que o ser humano tem inquietações comuns, independentemente das fronteiras, raças ou credos.

Cheguei a emocionar-me quando a tia Nina, a anfitriã, nos ofereceu- a mim e à Tatiana- uma capulana.

A capulana é um pedaço de tecido cheio de significado e é um presente com muito valor a quem o oferce e a quem o recebe. Uma boa capulana pode custar de 130 a 160 Mt. o que para os padrões locais representa certa quantidade de dinheiro. Mesmo assim, essas pessoas tão humildes, não hesitaram em vestir-nos tal e qual elas.

As mulheres com quem nos encontrámos no pátio ensinaram-nos a usar as capulanas e contaram-nos pedaços das suas vidas. O mais interessante é a forte identidade cultural com que se referem aos seus costumes. Têm sempre a curiosidade de saber como é que é “lá na Europa...lá no Brasil” sem jamais menosprezarem os seus próprios costumes, mesmo que aos meus olhos pareçam algo bárbaros ( a violência de género ou a vida dupla dos maridos).

O dono da casa, o Tio Dimas, deu-nos conselhos matrimoniais e a Tia Nina, que se bebesse mais 1 copinho cantava o fado, falou-nos do seu desejo de ir a Paris de lua-de-mel porque... adora perfumes. 




Miscigenação no pátio I

Miscigenação no pátio II



Me arrebenta

Nas festas africanas o que mais gosto de ver é o momento em que todos saltam para o meio da pista e se põem a mexer cada ossinho do corpo. No xtike da família do Edgar não foi diferente. Gostava de ser invisível para poder deleitar-me só com a observação. Mulheres grandonas e já entradotas nos 40 ou 50 mexem-se como raparigas novas. Elas não sabem mas são portadoras de uma grande sensualidade. Metidas nas capulanas fazem o rebola sem qualquer dificuldade e riem sem parar. Mesmo que mais ninguém tenha vontade de dançar elas não se envergonham de estarem sózinhas no meio da sala a dançarem ou de olhos fechados ou com um grande sorriso enquanto fitam a todos nos olhos.




Umas 6 horas depois de termos chegado como perfeitos desconhecidos despedimo-nos dos nossos novos amigo. Eu fiquei de alma cheia com a experiência e adorei a família do Edgar. Parecem muito unidos e preocupados uns com os outros.

O facto de eles dançarem e divertirem todos juntos e de se olharem enquanto o fazem ao ritmo de música tão animada, que apela à alegria, faz com que se desvaneçam todos os rancores familiares que possam existir entre eles.
Também é notável o esforço financeiro que fazem para disponibilizar determinada quantia em dinheiro quando os salários aqui são tão baixos.
O xtique é igualmente um reflexo da solidariedade entre famílias e um claro sinal de que, para os moçambicanos, as tradições ainda são o que eram.


Agradeço infinitamente o carinho com que nos trataram e a comida booooaaaa que nos serviram.
Kanimambo.