Cheguei
ao aeroporto de Cork, num voo de 2h30 directo desde Lisboa, com a companhia Aer
Lingus. À minha espera estava uma peruana de pura fibra que eu já não via há
dois anos. Não faz mal porque quando os laços são de qualidade, o tempo não
passa, só amadurece.
Instalei-me
numa pequena e simpática cidade chamada Midleton, a 20 Km de Cork, conhecida por
ter a destilaria do whisky irlandês Jameson “Jameson
Experience”.
Midleton
tem uma rua principal decorada com casinhas de 2 andares como muito, cada uma
de uma cor diferente e cheia de pequenas lojas de comércio local. Há também uma
estação de comboios, um Hotel, uma esquadra, dois rios e, como sempre, campos e
mais campos de verde. O ar cheira a flores, estrume e fritos. E pouco mais tem.
Mas as pessoas fazem os lugares e Midleton já é especial por isso.
A estação de comboios e a boleia
Logo
no primeiro dia, sem entender “un carajo”
do que estas pessoas diziam, toda a gente foi extremamente amável comigo.
Deram-me todas as indicações que solicitei. No segundo dia, sai de casa para
batalhar por um trabalho. No Posto de Turismo, a funcionária foi tão simpática
e acolhedora que eu quase achei que ela me ia oferecer o emprego dela, tal era
a vontade que demonstrava em que eu encontrasse um trabalho
Depois
fui andando pela cidade para tentar perceber, sem perguntar, onde ficava a
estação de comboios. Encontrei-a e senti-me uma otária a olhar para a máquina
dos bilhetes, não porque sejam máquinas com uma tecnologia demasiado avançada
mas porque me “informavam” gentilmente que um bilhete de comboio ida/volta até
Cork (4 paragens) custa a módica quantia de mais de 8€ (vão roubar pró ca*%&(»%). Vendo-me estática a olhar para a máquina, veio logo
um grupo de senhoras em meu auxílio perguntar-me se eu precisava de ajuda (não my Ladies, preciso dum
desfribilador que está-me a dar uma coisinha má...).
Depois,
já que estava ali com tanta gente à minha volta, perguntei onde ficava o
Midleton Park Hotel, porque tinha pensado ir lá entregar o meu CV. Uma mãe de
família que estava a deixar o filho na estação ofereceu-se logo para me dar
boleia. Eu ainda perguntei com um sinceramente humilde “De certeza?? É que eu posso ir a pé”, ao que ela respondeu “Absolutely dear”. Vi-me, pois na
obrigação de me justificar e dizer-lhe “não
se preocupe que eu sou uma pessoa de confiança”, ao que ela respondeu mais uma vez “ahahaha ABSOLUTELY my dear”. Poderia ter sido uma viagem
bastante mais desconfortável porque assim que entrei na carinha monofamiliar e
tive de levantar a perna para me sentar, as minhas calças de ganga cansadas de
andar para trás e para a frente nas colinas de Lisboa, fizeram um sonoro “GGGGGGGGGGGGRRRRRRRRR” e fiquei assim
com metade da bochecha do rabo de fora e ainda tive de ir deixar o meu CV na
recepção do hotel nesses preparos (secalhar é por isso que ainda não me
chamaram)...
Bom,
voltando à mãe de familia, foi super simpática e deu-me as boas-vindas à
cidade. No fim disse-me o nome dela- o qual eu não percebi- e combinámos que se
nos voltássemos a cruzar na cidade dir-nos-iamos “Olá”. Neste ponto, eu fui
extrememante sincera e expliquei-lhe que o normal seria que eu não a
reconhecesse porque à primeira vista todos me parecem absolutely loiros ou ruivos, absolutely
de olhos azuis e absolutely de
sardas. E referi “Tal qual nós vos pareceremos todos morenos lá no Sul”.
Resposta: “ahahaha ABSOLUTELY”.
O morto
Os
meus passeios não cessam e às vezes até me aborreço porque como a cidade é
plana e pequenina, em menos de meia-hora já dei a volta completa e isso nem dá
para desmoer o jantar ou para me cansar.
Como
já referi, as casas são todas baixinhas e repetem um costume que eu já tinha
visto no Reino Unido e na Suécia: deixar as grandes janelas abertas de par em
par e não poem vedação nos jardins privados. Assim, é muito fácil ver tudo o que
se passa dentro das casas. Imagino que para eles, ao tratar-se de algo normal,
nem sequer reparam no que se está a passar no interior da casa dos vizinhos.
Ora, eu sinceramente não consigo ignorar. Preciso sinceramente, sinceramente,
sinceramente de OLHAR. E dá-me igual que os meus olhos se deparem com um gordo
de meia idade deitado no sofá, agarrado a um peluche e a olhar para a tv, EU
PRECISO DE OLHAR (para estar informada).
Ontem
depois de ir correr, ia como sempre muito entretida a olhar para dentro das
enormes janelas, quando vi uma casa que tinha o interior na penumbra mas umas
dez velas acesas. Achei que eram velas demais e abrandei o passo e voltei a
olhar. Deparei-me então com um caixão aberto. Era alguém que estava a ser velado
na sua própria casa.
Destilaria Jameson, principal atractivo turístico de Midleton |
Detalhe de casa em Midleton |
Bairro familiar em Midleton |
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