segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Peripécias irlandesas: Hostal II

Peripécia - Segundo Aristóteles, "Peripécia é a mutação dos sucessos no contrário". Assim, poderemos considerar um acontecimento imprevisível que altera o normal rumo dos acontecimentos da acção dramática, ao contrário do que a situação até então poderia fazer esperar.

Quando voltei de viagem só tive vaga na casa dos horrores aka Abraham´s Hostal um par de dias mais por isso mudei-me para o Kinlay House Hostal, mesmo em frente ao Castelo de Dublin.

Enganam-se se pensam que tive vida de princesa. O quarto feminino de seis/oito beliches do anterior hostal foi substituído por uma camarata mista de dezoito camas. Acrescenta-se o facto de ter chegado na véspera de Halloween. Havia um rodopio tremendo de lobisomens e bruxas que podiam facilmente ser confundidas com senhoras da vida. A luz estava constantemente acessa e eu estava na cama de cima a levar com toda aquela incandescência. Até fiquei bronzeada! Depois, dormir em frente a tão Eminente monumento como vem a ser o Castelo de Dublin pode eventualmente ser interessante para os nepónicos que gostam muito de fazer fotos. Na prática não tem interesse nenhum porque os sinos tocam a cada quinze minutos. 
Entretanto, a gang do ronco tinha-se multiplicado quais coelhinhos e naquele quarto não se podia dormir. A noite de Halloween tinha vindo de golpe direitinha a mim, logo eu que só queria estar na minha cama tranquilamente a ler.

“Se não podes com eles, junta-te a eles”. Foi que fiz e nem precisei pestanejar.  Sabem aqueles autocolantes que se usam no Verão para atrair moscas? Eu venho equipada de fábrica com uma coisa do género, mas em vez de atraír moscas, atraí cromos:

Cromo 2: Gay até na maneira de respirar, brasileiro, trinta e dois anos, giro, giro, giro.

Cromo: “Hello, I am from Brazil and you?”
Sónia: Ah, eu sou de Portugal.
C: Oi?
S: Eu disse que sou de Portugal
C: Oi? Ah,entendi…Nossa, so we can speak portuguese, don´t you think so?
S: Claro! De onde é que és mesmo lá no Brasil?
C:Oi? Sorry?
S: Qual é a tua cidade lá no Brasil?
C: Ah, eu sou do Rio. Nossa, os portugueses falam bonitinho mas é bem dificil entender vocêis.
S:LOL
C: Adoro Paris. É a minha cidade de sonho. De onde é você lá em Portugal?

...

Depois de termos encontrado uma zona de conforto no portinglish ele disse-me que estava triste. A minha cabeça gritou-me “ainda estás a tempo de te despedires educamente e de te virares para o outro lado”, mas o meu coração AAAHHH O MEU CORAÇÃO esse maldito coscuvilheiro não se conseguiu conter e perguntou-lhe o que se passava. Contou-me que o namorado o tinha deixado mas mesmo assim ele o tinha convidado para a festa de Halloween. Se o namorado estivesse receptivo a uma reconciliação ele alinhava. Mas se o namorado não estivesse “se fodeu”. Contou-me que o plano dele era beijar toda a gente que estivesse na festa, escarrapachado na cara do outro. Eu apelei ao bom-senso e à auto-estima dele mas ele já não me ouvia. Aliás, estava tão absorvido pelo seu próprio mundo que dava duas stickadas de perfume na roupa, pousava o frasco, e voltava a agarrar nele dois segundos depois para dar mais stickadas. Pelo menos cheiroso devia estar!

...

No outro dia encontro-o (forma de dizer porque ele dormia na cama ao lado. Era só abrir os olhos e lá estava ele) e pergunto-lhe como tinham corrido as coisas. Falou, falou, falou só para me dizer que tinham corrido mal. O outro não queria nem saber dele e, por isso, ele tinha tido uma grande canseira a tentar seduzir pessoas na festa e tinha bebido até “cair di porri”.  Já ao final da tarde, voltei a encontrá-lo e comentou comigo que o namorado ia passar pelo Hostal a apanhá-lo para irem tomar algo e que ele, embora soubesse que o outro não merecia, tinha-lhe comprado um presente caro.


TO BE CONTINUED...

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