segunda-feira, 24 de junho de 2013

Cabeleireiro África


 Bem-haja a todos os valentes que por questões de saúde se vêm forçados a cortar o cabelo.

Hoje eu rapei o meu cabelo por iniciativa própria porque há muito tempo que se encontrava muito debilitado. Estava quase careca por causa de uma apoplexia capilar tremenda que eu tentei, durante vários anos, curar sem quaisquer resultados, depois de ter gasto rios de dinheiro em produtos para a queda e fortalecimento capilar.

Já há algum tempo que tinha pensado fazer esta pequena “loucura” mas como trabalhava num escritório nunca encontrava o timing perfeito. Aqui, posso vir dar aulas de pijama que tenho a certeza que as crianças não se vão importar.

Sexta-feira as meninas estavam-me a fazer trançinhas no pátio do orfanato e uma das mamanas* que trabalha na cozinha disse-me que adorava ter o meu cabelo. Eu disse-lhe que fazia intenção de o cortar e, portanto, se ela quisesse oferecia-lho. E assim, hoje, deixei que me cortasse o cabelo perante o olhar atónito e desolado de umas 20 meninas, do David, 2 freiras e outras 2 mamanas. Diz que vai fazer extensões com o meu cabelo e que se tivesse de comprar extensões de mulungo* custar-lhe-ião cerca de 3000MT (aproximadamente 80€).

Como referi, o meu cabelo era desde há vários anos, um cabelo triste e frágil do qual eu não gostava apesar de o mimar muito. Logo, à partida, não deveria ter sentido pena de me ver livre dele mas a verdade é que não sei de onde me veio tanta cobardia. Passei os últimos dias em pânico e sentia-me sem forças para dar o primeiro passo. Quando me levantei da mesa para ir chamar a mamana estava a tremer por dentro e hesitei muito. Não pude evitar pensar nas pessoas que têm cancro e se vêm obrigadas a “livrar-se” de uma parte delas de uma forma tão abrupta  ( e tão diferente da forma voluntária como eu o fiz, dotada de uma saúde de ferro).

Estou contente de o ter feito mas ando com uma capulana na cabeça porque tenho vergonha que me vejam assim. Além disso, há um grupo de meninas tremendamente indignadas com a minha decisão:
- Sofia: Venham tocar no cabelo da Mana* Sónia. Venham despedir.
- Amizuna: Não faz isso não. Você vai ficar feia. Estou a avisar.
- Vanessa: Mana Sónia o que é você fez Mana Sónia?
- Ângela (com cara muito triste): Mana Sónia diz para mim que é mentira.Que você não cortou cabelo!
A Junice desvia a cara quando eu olho para ela (nota-se que está ofendida) e a Ritinha tem uma cara que diz “Desiludiste-me miuda”. Antes de eu cortar o cabelo vieram-me pedir por favor que não o fizesse e não me deixavam andar quando ia em direcção à minha “carrasca capilar”. Pediram ao David para interferir a favor do meu cabelo. E, enquanto me via livre das minhas debís madeixa, tinha à minha volta uma boa dezena de olhos grandes e tristes.
Claro que lhes expliquei porque é que ia cortar o cabelo: que era para ficar mais forte, mais saudável, mais brilhante e que dentro de 3 meses elas já podem fazer trançinhas outra vez. E, desde o alto da sua sabedoria infantil, elas argumentam umas com as outras sobre as propriedades capilares dos brancos versus negros e dão-me ânimo “Mana Sónia você não se preocupa não que você vai ficar bonita outra vez, você vai ver!”

Ehehehe A-D-O-R-O estas criaturas.

*mamana (ou mamã) = mulher africana de tamanho XXXXXXL
*mulungu = branco (caucasiano)
*Mana = no orfanato as pessoas que não são religiosas (irmãs) são tratadas assim
 










2 comentários:

Anónimo disse...

vitamina B12, comer amêndoas e boa disposição e o cabelo volta :) gosto do blog

Ofélia Queirós disse...

Caro anónimo, muito obrigada por comentar. Seguirei os seus conselhos à risca. Volte sempre