sábado, 18 de maio de 2013

O 25 de Abril a meados de Maio

Recordações da Guerra Colonial/ Libertação

Aqueles que me conhecem sabem que me derreto com a “Revolução dos Cravos”. E não é de agora o meu interesse. É uma questão de educação.
Na minha casa não fomos substituindo tecnologia por tecnologia. O gira-discos sempre conviveu pacificamente com o leitor de K7 e, mais tarde, com o leitor de cd´s. Por isso, do meu repertório infantil e juvenil fazem parte dois vinis do Adriano Correia de Oliveira e uma k7 pirata do concerto dos Resistência ao vivo no Coliseu, com uma pequena homenagem ao Zeca Afonso. Mais tarde, já em versão digital, ouvi outros artista de inspiração revolucionária: Sérgio Godinho, Pedro Barroso, Fanha etc...

Desde o alto da minha arrogância de adolescente, o 25 de Abril era já muito mais que um feriado sem escola ou o dia do aniversário do Paulo David (o coleguinha mais giro da escola primária). Doía-me como algo muito pessoal que toda a gente fosse para o centro comercial desfrutar da folga, sem nem sequer fazerem uma menção de honra sobre o dia em questão. Ou quando faziam, diziam coisas tão banais como “Opá, tamos é a precisar doutra revolução para correr com esta escória” ou então “Bah, tanta revolução e não serviu para nada”.

Não quero dizer com isto que eu fosse uma criança-adolescente prodígio. Nada disso! Sentia a mesma simpatia pelo Carnaval e, depois, pelo dia da Restauração. Mas já então achava que a Revolução dos Cravos tinha sido algo excepcional.

Mais tarde, quando já estava na faculdade, conheci a Cecília, uma colega com filhos da minha idade, que tinha histórias biográficas relacionadas com a censura e a PIDE. No dia 25 de Abril de 2004 fomos juntas ao desfile na Avenida de Liberdade ao Rossio. Foi a primeira vez que me envolvi in persona no ambiente saudoso da revolução com a população, os cravos, o desfile militar, os sindicatos e a Cecília a contar-me de viva voz como tinha sido tudo.

Quando saí de Portugal para trabalhar num ambiente com pessoas de diferentes nacionalidades descobri que, para alguns, a nossa revolução era um referente. Sobretudo, os meus amigos espanhóis, falavam da revolução como um milagre. Ao princípio não percebia muito bem porquê e parodiava com eles. Dizia-lhes que estavam enganados, que a população tinha saído para a rua não para apoiar os militares, mas porque pensavam que a Junta de Freguesia estava a distribuir sardinhas, pão e vinho à borla. Depois, à medida que fui conhecendo a História Moderna de Espanha, percebi que o 25 de Abril foi para eles a luz ao fundo do túnel, depois da Guerra Civil e de mais de 40 anos sob a batuta do General Franco, e que só voltariam a respirar Liberdade e Democracia em 1977, sempre com o exemplo do país vizinho na mira.(n.b: Franco morreu em 1975, quentinho e recolhido no quarto, sem que o tivessem expulsado)

Nunca deixei de reflectir e de me apaixonar por um dia tão grande da nossa História. Lamento se vos soa a discurso inflamado de uma nacionalista. Não é isso, é apenas uma euforia passional. Não sinto a mesma paixão por outros referentes, talvez tão ou mais grandes da História de Portugal. ( que o Vasco da Gama descobriu o caminho marítimo para a India? Que o Mário Soares foi Presidente da Républica? Importa-me tanto como o cú da burrica)

Logo, quando soube que a Embaixada de Portugal em Maputo estava a organizar várias sessões cinematográficas no âmbito do Dia da Lingua Portuguesa eda Cultura, dia 5 de Maio, e que entre os filmes eleitos estava “Capitães deAbril”, fiquei muito contente e, pela primeira vez, senti simpatia pela nossa representação diplomática ( depois de isto e isto).

Embora me tenha chocado o facto de só estarmos eu, o David e os três empregados da galeria de arte onde projectaram o filme -porquê tanto desinteresse?- uma vez mais pude comprovar que a minha admiração pelo 25 de Abril não é em vão. Foi mesmo um momento subversivo importante, que nasceu da vontade do Ser Humano ser Livre. Primeiro os militares, depois os populares que se juntaram e mais tarde a opinião pública.

[ “... Deus quer, o Homem sonha, a Obra nasce...”] Fernando Pessoa, in "O Infante", Mensagem, 1934

Embora algumas cenas do filme sejam lugares comuns, adorei a forma como a Directora Maria de Medeiros filmou e contou as 24 horas da Revolução. No dia seguinte vi o making-off e, ouvi, sem grande surpresa, como um dos produtores comentava que na gravação da cena no Largo do Carmo, antes e depois das negociações entre Salgueiro Maia e Marcelo Caetano, os figurantes -actores e anónimos portugueses- gritavam palavras de ordem de uma maneira eloquente e espontânea, sem que fosse necessário que o staff os instruísse para tal. Igualmente constatei que, uma das poucas coisas boas que nos deu a ditadura, foi o facto de as circunstâncias terem levado a que seja um período extremamente musicado.

Para aqueles que a viveram in loco, para as gerações sacrificadas e massacradas pela Guerra, para os perseguidos e maltratados pelo regime, nós, os privilegiados filhos da Revolução ou aqueles que a ela sobreviveram, temos a obrigação de seguir contando e comentado as coisas tal e como aconteceram ou até mesmo à nossa maneira sem, contudo, permitirmos que caia no esquecimento. E faz ainda mais sentido se tivermos em conta a época tão dura que se vive na Europa, onde os ditadores financeiros pautam a nossa vida, ou até a situação que se vive nos PALOP onde aqueles que outrora lutaram pela Liberdade dos seus povos e cultura, agora se deixam encantar pelo canto da sereia e do cifrão e sacrificam a sua gente.

[ “...amigo, maior que o pensamento...não percas tempo que o vento é meu amigo também...”] José Afonso




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