Era uma vez uma rapariga irlandesa. Cabelo ruivo, outfit demasiado exagerado, três pacotes de base barata a rebocarem uma pele que poderia ser mais jovem se não fosse tão massacrada pelos polyparaben. Ah e um cachecol. Ela levava sempre um cachecol trendtopic. A rapariga costumava andar na rua sem andar. Normalmente desfilava para uma pequena multidão narcisista que passa tanto tempo a auto-retratar-se e a fazer upload em tantas páginas cheias de selfies que dúvido que no fim do dia sobre tempo para ver outras fotos que não as próprias. Ela andava sem olhar para os passos que dava porque normalmente na mão levava o iphone. E enquanto andava ia-se vendo a caminhar.E ia reclamando dos tantos defeitos que se via nela própria. Eram tantos, tantos, tantos que não parava de maquilhar-se e comprar roupa para tapar a esses tantos defeitos merecedores de duzentas auto-retratos diários. E enquanto andava nem reparava nas pessoas que passavam por ela: as tias, as vizinhas, os amigos de carne e osso. Uma rapariga sózinha numa página cheia de multidões. E ela andava e andava. E via-se reflectida no iphone. E enquanto andava e andava o cachecol ia-se soltado do pescoço. E ia e ia em direcção ao chão. Mas a rapariga ia tão entretida a admirar-se a si mesma que nem reparava que levava o cachecol a arrastar pelo chão. E um dia, enquanto se via no reflexo do iphone e o dedo já estava a carregar na tecla que faria outro selfie original- entre tantos- a rapariga tropeçou no cachecol, caíu no chão, partiu o nariz e borrou a maquilhagem. E eu, que às vezes vejo coisas que preferia não ver, morro de curiosidade de saber como teria ficado esse selfie se o iphone não se tivesse partido em mil pedaços, quando o cachecol decidiu dizer à rapariga "hey, psiu, olha para a frente se não cais!".
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