sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Observações de um ser quase adormecido

Munique, 5 de Janeiro de 2009

Estou no Aeroporto de Munique pela bilionésima vez. Já fui ver alguma lojas, já me fui borrifar com perfumes que, embora não tenham taxas, são inacessíveis aos meus bolsos de “assalariada” ilegal na Macedónia.
Descobri que todo o Aeroporto está desenhado de maneira a nao permitir que os traunseuntes durmam uma sesta entre um voo e outro. Para falar a verdade, nem me atreveria a adormecer num aeroporto de um país tão recto e industrial.
Talvez seja um estereotipo (é com toda a certeza) mas todas os relatos que amigos e conhecidos me fazem da Alemanha descrevem um país onde tudo é irritantemente perfeito. Inclusivé este é o relato dos alemães.
Já percebi que quem viaja em classe económica não tem acesso aos Lounges e à internet. Grande treta. Um país evoluído excluí desta forma o acesso á informação.
Faltam 5 horas para o meu próximo voo. Sei que as viagens para o centro da Cidade custam um absurdo e demoram mais de 1 hora e meia,ida e volta. Resta-me, portanto, ficar aqui sentada . Observar e ser observada.
Menos mal: o café, o chá e o sumo de limão são de borla, para TODOS. Ah, e os jornais diários, da Alemanha, também. Ich Spreche keine Deutsche
Tento fazer exercícios mentais. Tento manter-me acordada. Inevitalmente estes exercícios acabam na estereotipação dos que passam.
À minha frente está um casal de meia-idade. Parecem-me portugueses. Estão a beber galão e um pão esquisito. O homem até me parece que está com cara de quem está a pensar “O que eu queria era um paposeco”...Ah, descubro que são franceses mas pareciam mesmo portugueses. (agora até sinto um certo orgulho. Os franceses, normalmente, tem um estereotipo bastante pejorativo dos portugueses)
Depois tento sonhar com destinos. Nunca me senti muita atraída por destinos tropicais mas inevitavelmente desejo embarcar no voo para o Rio de Janeiro. Olho pela janela do Aeroporto e vejo neve. Imagino como seria depois de uma viagem longa(e puro pânico) chegar à cidade maravilhosa. Nadar nas águas frias de Copacabana e subir ao Corcuvado. Passear nas ruas mais antigas onde são visiveis as influências da arquitectura europeia.
Também começo a sentir curiosidade pelas Megatrópoles do Oriente. Sei que é preciso algum dinheiro. Arrumo o Oriente na minha caixa de sonhos mentais para depois dos 40. Como não planeio ter filhos não me parece de todo impossível.
Antes, concerteza, vem a tão sonhada viagem à Patagónia argentina. Visitar o estreito de Magalhães e conhecer parte da rota do primeiro humano que fez um interrail à volta do mundo. Por vezes sinto-me um pouco como ele. Frequentemente oiço as pessoas dizerem-me “Sónia és a primeira portuguesa que conheço”!!!
Pelo meio desejo passar uma temporada de longos anos em Cabo-Verde. Ter a minha própria casa na Ilha de São Vicente. Sentar-me ao final do dia, nos degraus da frente, descalçar os sapatos e conversar com os vizinhos sobre as rotinas da Ilha. No fim, com um suspiro, dizer a mais linda expressão criada pelo Homem “N´STA SABIA”
Vou deambulando por Paris. Imagino-me com a minha boína azul, a deambular pelas margens do Rio Sena. A língua francesa sempre foi uma das minhas preferidas. Estudei-a durante 8 anos. Nos ultimos 2 anos era boa aluna e conseguia manter uma conversação. Agora já esqueci quase tudo, já esqueci grande parte do vocabulário , pu-la em 4ºlugar na minha lista de idiomas preferidos. Assim se perdeu uma entusiasta.
Também me apetecia dar um “saltinho” a Sevilha. Quem sabe assistir a um concerto do Paco de Lúcia e não fazer nada o resto do tempo. Apenas sonhar com este “torero”. Há que aproveitar a atmosfera andaluza!!
Acabo por perceber que o que me faz sonhar tão entusiasticamente com outros destinos é a cruel realidade que me espera: um voo até Sofia, uma noite na estação de autocarros, 6 ou 7 horas de viagem até Skopje e, pelo meio, a dificil interacção com as fronteiras fora do espaço Schengen!
Mais 6 meses de aventura nos Balcãs. Valerá a pena? Quando estou lá,rodeada de amigos, sinto que já valeu a pena por isso. Sinto que nunca estive realmente sózinha. Sinto que alguma coisa já mudou dentro de mim. No entanto fico mesmo chateada quando tomo consciência que pouca coisa mudou para eles.Para a grande maioria deles depois de mim, depois dos meus oito colegas de nacionalidades diferentes vão chegar outros “colegas” recheados de fundos da União Europeia. Eles, vão continuar a alimentar a guerra fria que mantêm com os países vizinhos.
Há pouco brincava com os estereotipos. Considero-os, até, necessários, porém não há nada mais gratificante que aceitar a multiculturalidade. Vivê-la intensamente como se fosse uma dádiva.
Salazar ousou dizer que estávamos “orgulhosamente sós”. Jamais os seres humanos gostaram de estar sós. Quando o fogo apareceu o aparelho fonético foi desenvolvido e surgiu o serão. Os seres humanos tinham, por fim, uma razão para ficarem acordados até às tantas.

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